O Forte
Forte de Lobelhe, nascido sobre as ruínas de um antigo castro da Idade do Ferro e que foi fortemente romanizado e ocupado até estádios adiantados da Alta Idade Média, é fruto do divórcio que enredou as coroas portuguesa e espanhola e degenerou na Guerra da Restauração ou da Aclamação. Entre as diversas designações que teve, destacamos a de Forte de Azevedo, Forte da Breia, Forte de São Francisco, Forte de Lobelhe e até Forte de Novelha como aparece escrito num texto de meados do século XVIII. . Foi mandado construir entre 1649 e 1654 por D. Francisco de Azevedo, Mestre de Campo General da Província do Minho para reforçar a defesa do castelo de Vila de Vila Nova de Cerveira, erguido por D. Dinis e que na altura estava desajustado às novas técnicas defensivas e do armamento balístico que tinha um poder destruidor bem superior ao medieval. Com a sua construção pretendeu-se colmatar uma lacuna na defesa da vila que, para fazer frente a uma mais que provável ofensiva espanhola a partir da Galiza.
Finda a guerra a fortificação entraria num paulatino abandono, pontuado por trabalhos de refortificação que a documentação existente vai dando notícia. O primeiro ocorreria em 1776, havendo pelo menos um segundo, relacionado com um conjunto de relatórios que se multiplicam entre os finais do Séc. XVIII e os anos de 1804 e 1805, antevendo os conflitos gerados pela ambição napoleónica.
Provavelmente a única vez em que o Forte de Lobelhe entrou em guerra foi, em 1809, no decurso da 2ª invasão francesa a Portugal. De acordo com a descrição da marcha de Soult através da Galiza, sabemos que o forte de Valença e o de Lobelhe receberem reforços em homens e artilharia de modo a impedir qualquer tentativa da travessia do rio. Após uma frustrada tentativa junto a Valença, Soult tentou uma outra, em frente a Vila Nova de Cerveira, mas a artilharia do Forte de Lobelhe juntamente com a bateria da Mota, às ordens dos respetivos comandantes, atingiram alguns dos barcos invasores, desorganizando a flotilha, o que fez abortar o intento. Se não atente-se na descrição do acontecido enviada pelo comandante do forte ao Coronel Gonçalo Coelho de Araújo: “e avançando-se então três barcos se escaparão para o sítio da Motta dous tiros de peça que lhes atirei; porém estando neste sítio assentada outra peça e fazendo fogo sobre elles, os varou em terra; então atirou o forte de Lovelhe aos outros que hião sahindo e mettendo huns a pique, fez retroceder os outros”. Os franceses acabaram por invadir Portugal via Chaves e rapidamente chegaram ao Porto de onde partiram à conquista da província do Minho. Por isso a resistência à invasão francesa foi temporária, porque as tropas de Soult, depois de terem tomado Braga e Ponte de Lima, cercaram Valença que se rendeu, avançaram sobre Vila Nova de Cerveira, Caminha e Viana do Castelo, o que equivale a dizer que as praças intermédias, como Lobelhe, tiveram o mesmo destino. Embora não haja um relato efetivo do sucedido tudo indica que o forte foi tomado pelos franceses e que as instalações foram destruídas pelos invasores.
Ultrapassada a fase da guerra com os franceses, as praças-fortes da linha do Minho voltaram à inatividade e na maior parte dos casos, mesmo a um abandono progressivo, pese embora os cíclicos diagnósticos efetuados sobre o estado delas. No caso vertente o forte de Lobelhe não foi exceção. O autor de um relatório elaborado em 1824 era de opinião que o forte de Lobelhe deveria ser conservado por causa da sua vantajosa posição e porque era um obstáculo à travessia do rio, mesmo “com a pequena guarnição que tem”. A prova que este forte continuava a ser ocupado é o facto de existir um mapa das forças militares elaborado em 1822, mas a fazer fé em Figueiredo da Guerra, a partir de 1820 não passava de um aquartelamento de veteranos. É este mesmo autor quem informa ter sido o forte aproveitado para lazareto, por altura da epidemia de febre amarela de 1857. Esta informação está também contida na obra de José Augusto Vieira o qual termina dizendo que na altura em que escrevia, o forte desmoronava-se “pacifcamente na sua decrepitude, sem que se lhe conheça outro préstimo Senão exactamente o de ser um bello ponto de reparo com as suas linhas de pentágono, na meiga paysagem de que faz parte”.
Um último relatório datado de 1861 informa-nos que os terrenos do forte pertenciam ao Ministério da Guerra que este os trazia arrendados, mas o forte em si estava abandonado. Convinha, todavia, conservá-lo para servir de posto de vigia, pelo que se tornava necessário reconstruir os quartéis que já haviam desabado. As indicações não foram, no entanto, seguidas. O abandono e sobretudo, a sua agora inutilidade militar, levou a que o Estado Português, através do Ministério da Guerra, no dia 28 de Março de 1928, autorizasse a venda do prédio militar nº 12, ou seja uma casa abarracada que estava em ruínas no interior do forte e que se destinava a habitação do encarregado dos quartéis, a João de Portugal Marrecas Gonçalves. No interior do forte havia outras construções nomeadamente aquelas que tinham sido usadas como quartéis. O Ministério da Guerra, proprietário daquele espaço passou a alugá-los a particulares até que em 1934, ano em que a posse passou para o Ministério das Finanças, que seguiu os mesmos procedimentos. Finalmente no dia 7 de Janeiro de 1985 o forte passaria a integrar o património municipal.
Atualmente o forte apresenta-se como polígono irregular composto por cinco baluartes terraplanados. Voltados ao rio estão dois baluartes com formato semelhante, ligados pelo mais extenso dos panos de muralha. Em sentido oposto há mais três, sendo que o mais central, que também é o mais possante, defende o acesso à praça de armas e à única porta de acesso ao interior do forte. Os baluartes situados nos extremos, também semelhantes entre si, tinham por missão impedir o acesso, fosse ele pelo lado norte ou pelo sul, que forças hostis circulassem pela estrada Vila Nova de Cerveira para Valença.
Pelo exterior completa o conjunto um fosso originalmente com mais profundidade que no presente. Para quem conseguisse aproximar-se da base da esplanada do forte, pouco mais via que pequenos lances do parapeito e as guaritas que se destacavam no conjunto. Os parapeitos em terra, que rematavam as muralhas, estão hoje já bastante esbatidos ou mesmos inexistentes em certas partes do seu circuito. Conserva-se a porta de acesso à praça de armas. Esta é única e está voltada a sudeste. Define-se por dois arcos de volta perfeita e um túnel lateralmente defendido por dois muros de pedra. A sua cobertura, enquanto a teve, era feita em madeira, de modo a permitir a circulação no polígono interior. As construções que existiam no interior, ao nível da praça, nomeadamente os quartéis e paiol, desapareceram, mas conservaram-se as suas marcas nas paredes que sustentavam o terrapleno. O acesso aos terraplenos, baluartes, banquetas, parapeitos e guaritas, faz-se através de três rampas em terra, e cujo acesso direto à praça permitia a chegada rápida de homens, armas e munições em tempo de guerra.
Texto adaptado de ALMEIDA, Carlos A.; RAMALHO, Paula; Memórias Arqueológicas do Forte de Lovelhe; 1985-2015; Câmara Municipal de Vila Nova de Cerveira; 2015.
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